segunda-feira, 17 de setembro de 2012

The Sinister Urge


Estive de férias até hoje... Amanhã volto ao trabalho e já sinto o choque do regresso. Chamemos-lhe o "choque pós traumático do regresso de férias".
Os regressos de férias são sempre demasiado dolorosos, sobretudo porque por um lado detesto o que faço, como também detesto trabalhar em seja no que for.
O pior de vir de férias nem é o calor insuportável que ainda se fez sentir esta semana, nem sequer o acordar cedo. Uma das piores coisas de vir de férias é a primeira pergunta que invariavelmente é feita pelos parvalhões dos colegas.
E qual é então essa pergunta? "Então e essas férias?" Em primeiro lugar quero aqui deixar bem claro, que isso nem chega bem a ser uma pergunta, logo nem merece resposta. Mas eles também não querem ouvir resposta. Ainda assim o protocolo manda que se responda "Curtas! São sempre curtas!" ( sorriso amarelo q.b )
Eu gosto de variar e repondo sempre: "Não foram nada de especial, mas pelo menos foram dias em que não vos vi."
Seria de esperar que isso causasse incómodo, mas não. Porque eles nem ouvem a resposta ou acham que eu estou a brincar. Como todo o bom trabalhador regressado de férias saberá, a primeira pergunta foi só a preparação para a conversa parva que se segue:
"Baterias carregadas? hã? Espero que tenhas descansado muito para o trabalho que se segue!!!
É óbvio que no primeiro dia estamos tão cansados (ou mais) como no dia em que fomos de férias. Ou então é o estado de latência em que o nosso cérebro se encontra. O choque do regresso costuma ter esse efeito.
O protocolo manda que se responda "ahahah" (risada pouco convicta ou sorriso amarelo q.b.)
Escusado será dizer que o primeiro "desafio" é tentar não fazer nada durante a primeira semana, saltitando de ronha-em-ronha e de desculpa -em-desculpa. O segundo desafio consiste em ir ver ao calendário e ver qual será o próximo período de férias e começar a contar os dias até lá.

E é isso. Acabaram-se as férias e já não posso praticar a minha actividade favorita: Fazer nada.

terça-feira, 6 de março de 2012

Always look on the bright side of life

-Estavas a dormir? No trabalho?, indagou ela, referindo-se, provavelmente, aos meus olhos claramente injectados de sangue.
-Acho que ainda estou. A dormir e a sonhar. Disse-lhe eu, aproximando-me e acariciando a linha do seu rosto com o indicador.-Porque tu saíste directamente dos meus sonhos, boneca.
Ela afastou a minha mão quase com violência como se não me quisesse. Aaaahhh, o intemporal jogo de sedução, do gato e do rato. Sorri para mim mesmo. E para ela também. «Sim», pensei, «eu jogo, mas comigo o jogo é o "Monopólio": dá as voltas que quiseres, bebé, mas no fim acabas num hotel barato ».
-Tentei ligar-te montes de vezes, mas dá sempre sinal de imp...-interrompeu-se ao avistar o telefone no chão, em pedaços, entre as garrafas de vodka barata, um martelo e um LP da Roberta Miranda.
-A linha tem problemas, referi casualmente, acabando a garrafa de Gin de um trago só e acendendo dois cigarros e atirando para o ar, uma grande baforada de fumo.
-Tenho um problema, disse ela, recuando um passo, o pensamento claramente toldado pela inegável e crescente tensão sexual entre nós.
-Um problema...«sei», pensei eu com um esgar trocista nos lábios «mulheres como ela eram o problema. problema tão indecifrável como um cubo de Rubik».
-Um quê?Hã?!, interpelou ela de sobrolho franzido.
-Às vezes penso em voz alta.O que pode ser problemático, principalmente quando, como agora, pensava na forma dos seus generosos seios. Os teus generosos, arquejantes e bamboleantes e provavelmente simétricos seios, sem aquela veia azul horrorosa que algumas têm.
-Pára com isso! Esses comentários são completamente inapropriados e nojentos. Tu és asqueroso, rematou ela, tentando, em vão, resistir à atracção que sentia por mim.- A impressora tem um "paper jam" e não consigo tirar o papel. Já tentei com uma pinça e tudo, mas não consigo. Ajudas-me ou não?
- Se calhar é preciso uma pinça maior. Disse-lhe eu com o meu sorriso nº9, que só uso quando a presa está já no papinho há muito.As suas palavras diziam uma coisa, mas a sua linguagem corporal; os braços cruzados, o pé tamborilando impacientemente no chão e o olhar furioso, eram a linguagem da mais pura luxúria e do desejo carnal.
Atirei o cigarro para o cesto do lixo, agarrei-a pelo pulso e puxei-a para mim, escostando-me à sua cara. -Escuta, fofa, mulheres como tu são apenas sarilhos de saias, voz aveludada e seios arquejantes e bamboleantes.E eu preciso de mais sarilhos como preciso de aftas na boca.
-Mau...disse ela, afastando a cara com uma carêta, certamente para não cruzar o seu olhar com o meu. Ela sabia, no mais profundo do seu ser, que quando isso acontecesse, seria o início da contagem decrescente até bater com as omoplátas no meu colchão.
-Dás-me ao menos o número da assistência técnica?, implorou ela, libertando-se.
-Assistência técnica, sim é só isso que queres de mim né baby? Sou um objecto para ti.Ok!, exclamei, Ganhaste! Não posso resistir a esses olhos doces. Nem ao ondular dos teus seios arquejantes e bamboleantes.
-Oh que car...
-Shh, interrompi eu, pousando o indicador sobre os seus lábios, a ponta acariciando a gengiva húmida, não precisas dizer nada fôfuxa.
-Tens a mão pegajosa...
-É da cola, respondi de pronto.Ambos olhámos em volta; não havia tubos de cola à vista.
-Não podes provar nada, completei, interrompendo o silêncio momentâneo.De súbito a sua expressão assume um tom assustado, com certeza uma manifestação do seu anseio de volúpia flamejante.
-Fogo! Gritou ela por fim.
Sim, querida, também o sinto, o amor é fogo que arde sem se ver, disse-lhe enquanto acabava a garrafa de conhaque.
-Não, fogo!, voltou a exclamar.
-Sim, fogo.
-O cigarro...
-O cigarro vem no fim, ma petite chérie, disse-lhe com uma piscadela de olho, arreganhando a dentuça amarelada. Sentes a paixão que te intoxica, né minha costeletinha de porco?
-É o fumo!, guinchou, de forma pouco muito pouco atraente.
-Sim, my dear, o fumo... o fumo do desejo, disse eu, tentando fazer sentido do que dizia. Uma coisa era certa: o seu forte não era a palavra. (Eram os seios arquejantes be bamboleantes.)
Saiu, a correr, decerto com medo de ceder à tentação,de se perder comigo num vortex de emoção, perigo, aventura e orgasmos múltiplos, deixando-me a sós com a ressaca que ameaçava devoraro meu corpo. Uma ressaca horrível, por sinal, como se até ouvisse sirenes, mas daquelas dos farois em dia de nevoeiro. Sorri, dando um último gole de Havana Club. «meu sacana», pensei eu, «és um pinga-amor incorrigível».